23/10/2015
Por Daniela Ades*
O governo brasileiro tem sinalizado que pretende apostar no setor agropecuário para reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa do país.
Na plenária da ONU, em 27 de setembro, a presidente Dilma Rousseff anunciou a Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida (INDC, na sigla em inglês) brasileira que será levada para a 21ª Conferência das Partes (COP) da ONU sobre Mudança do Clima. A COP será realizada em Paris, de 30 de novembro a 11 de dezembro.
A meta para o setor agropecuário é fortalecer o Plano de Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC), restaurar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e aumentar em 5 milhões as áreas de Integração Lavoura-Pecuária-Florestas. Estas metas somam-se àquelas estabelecidas em 2010 pela Política Nacional de Mudanças Climáticas (Lei n 12.187/2009) e seu respectivo Decreto de Regulamentação (Nº 7.390/2010) para o Plano ABC, quando o Governo havia estabelecido o compromisso de restaurar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2020, e a ampliar em 4 milhões de hectares de áreas de integração lavoura-pecuária-florestas até 2020.
Caso as ações sejam de fato implementadas e alcançadas, elas poderiam representaruma redução de 28% das emissões, em relação ao ano de 2005, do setor agropecuário. Atualmente, ele está dentre as três maiores fontes de emissões do país, junto com setores de mudança do uso do solo e energia.
O Brasil é um importante ator na redução de emissões nesse setor por ser um importante produtor e exportador agrícola do mundo e ter sua economia fortemente baseado na agropecuária. Em 2015, o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) é de R$ 463,3 bilhões.
Além da uma meta considerada relativamente ambiciosa para o Plano ABC na INDC, o Brasil já havia anunciado intenções de investimento para aumentar o alcance desse Plano. Em agosto, as presidentes Dilma Rousseff, do Brasil, e Angela Merkel, da Alemanha, anunciaram diversos compromissos bilaterais com foco nas mudanças climáticas. Agricultura e florestas foram dois grandes temas de discussão pelos dois países, com destaque para o ARPA, CAR e o Plano ABC.
O Plano ABC foi instituído em 2009, com o anúncio da Política Nacional de Mudanças Climáticas (Lei n º12.187/2009), prevendo a redução de 134 milhões a 163 milhões de toneladas de CO2e até o ano de 2020. A meta geral da PNMC é uma redução de 36 a 39%, aproximadamente, da projeção de crescimento de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) do país (modelo business as usual).
Já se passaram seis anos da instituição oficial, mas o Plano ABC ainda está aquém de seu potencial. Com dois anos de funcionamento pleno, desde 2013, o plano setorial nacional para reduzir as emissões de GEE na agricultura agora passa por uma revisão, com o objetivo de torná-lo mais difundido entre os agricultores.
Estudos recentes mostram que ele teria o potencial para evitar a emissão de 1,8 bilhão de toneladas de CO2eq. até 2023, de acordo com o Relatório “Invertendo o sinal de carbono da agropecuária brasileira”, do Observatório do Plano ABC.
Segundo Angelo Costa Gurgel, coordenador do Observatório do Plano ABC, a cada ano cresce o número de agricultores que acessam a linha de financiamento, o Programa ABC, para implementar as práticas de baixa emissão de carbono. O crescimento de contratações do Programa ABC no Ano Safra 2014/2015 foi de 36%, segundo dados do MAPA.
“Essa transformação, de adoção de tecnologias de baixa emissão de carbono, deve estar ocorrendo no campo”, afirma o coordenador, explicando que são práticas já conhecidas pelo agricultor, mas pouco difundidas no setor agropecuário.
No Plano Safra 2015/2016, foram destinados R$3 bilhões para o Programa ABC, porém com taxas de juros mais altas em relação ao ano anterior. “Dentro do contexto atual da economia brasileira, é razoável pensar que se sofreria esse corte, mas pensando a longo prazo, que a agricultura de baixa emissão de carbono deveria se tornar uma prática mais difundida, nós gostaríamos de ter visto o contrário”.
O Plano ABC é composto por sete programas, seis deles referentes às tecnologias de mitigação, e ainda um último programa com ações de adaptação às mudanças climáticas:
• Programa 1: Recuperação de Pastagens Degradadas;
• Programa 2: Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF) e Sistemas Agroflorestais (SAFs);
• Programa 3: Sistema Plantio Direto (SPD);
• Programa 4: Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN);
• Programa 5: Florestas Plantadas;
• Programa 6: Tratamento de Dejetos Animais;
• Programa 7: Adaptação às Mudanças Climáticas.
Por outro lado, parte da estrutura institucional e governança do Plano ainda não teve início, como, por exemplo, o laboratório multi-institucional que vai mensurar a quantidade de carbono capturada e as emissões que estão sendo evitadas com as práticas de baixa emissão de carbono. “Até o momento, não se tem nenhuma avaliação de fato de quanto carbono foi capturado nos projetos. Sem essa informação, não é possível saber se nós alcançamos metade da meta, se estamos aquém do processo ou se estamos avançados em relação à meta de redução de emissões”. A única referência disponível são os números de projetos e a área que está sendo abrangida pelos projetos do Programa ABC.
A implementação do plano setorial de mitigação na agricultura ainda fica aquém do potencial por não incluir ainda a Agricultura Familiar. A agricultura familiar, sob a gestão do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), representa 84% dos estabelecimentos produtores, de acordo com o MDA, e gera 38% do valor bruto da produção agropecuária nacional, produzindo a maior parte dos alimentos que vão para a mesa da população brasileira. Apesar de sua expressiva importância, a Agricultura familiar ainda não está inserida no Plano ABC e não tem linhas de créditos para práticas de baixa emissão de carbono.
Potencial da Amazônia
A Amazônia é considerada uma das regiões mais estratégicas para a implementação do Plano ABC. “Só na Amazônia, o potencial seria suficiente para se cumprir as metas brasileiras”, afirma Angelo.
Entretanto, o status de implementação do Plano na Amazônia ainda está aquém do necessário. Dos seis estados brasileiros da Amazônia Legal, dois estão ainda em fase de planejamento (Amazonas e Acre) e os outros quatro estão em fase de implementação dos seus Planos ABC Estaduais. Nenhum deles apresenta dados de monitoramento dos programas, de acordo com levantamento realizado pelo Observatório do Plano ABC (disponível no site).
“Na Amazônia, nós percebemos que poucos estados têm os comitês estaduais de gestão do Plano ativos e com o Plano ABC estadual desenvolvido. A grande maioria dos estados está em fase de elaboração do Plano ABC em si”. Angelo explica que há escassez de recursos para implementar ações de divulgação. “A gente percebe que na Amazônia existe uma realidade um pouco mais carente de implementação do Plano”.
Dentre os principais entraves encontrados na região, o coordenador do Observatório do Plano ABC destaca: a regularização fundiária, ambiental e problemas logísticos que encarecem a chegada de insumos e o escoamento da produção. Todas essas questões dificultam ou impedem que os agricultores consigam o crédito disponível do Programa ABC. “Então, pensar que ela recebeu 20% dos recursos tomados no programa até agora, é um número até considerável diante dessas dificuldades”.
Políticas Agrícolas em Sinergia
Angelo Gurgel afirma que diversas políticas voltadas para a agropecuária estão convergindo para uma sinergia, como o Código Florestal, o CAR e o Plano ABC. As políticas não estão diretamente ligadas entre si, uma vez que o Plano ABC não tem metas de contenção de desmatamento, por exemplo. “Estão convergindo diversas situações que vão ser positivas para a agropecuária. O CAR, a regularização ambiental… Tudo isso vai contribuir para que seja mais fácil o agricultor tomar [crédito] para as práticas do ABC”.
À medida que o Plano ABC aumenta a eficiência no recurso terra e a produtividade da agropecuária, ele atua reduzindo a pressão sobre o desmatamento, explica o coordenador do Observatório.
Revisão do Plano ABC
Em agosto de 2015, o Observatório do Plano ABC lançou um documento com propostas para a revisão do Plano ABC, da qual o IDS é participante. São 63 propostas distribuídas em seis grandes áreas: “Do compromisso internacional à política pública”; “Divulgação e Capacitação”; “Governança e articulação institucional”; “Monitoramento e controle do Plano ABC”; “Transparência;” e “Conhecimento”.
*Daniela Ades é analista de comunicação do IDS
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