As consequências da falta de ação política no Rio Grande do Sul

14/05/2024

O Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) expressa profunda solidariedade ao povo
do Rio Grande do Sul diante da tragédia das enchentes que assolam o estado. As histórias
de perda e sofrimento nos comovem e reforçam a urgência de ações concretas e eficazes
no enfrentamento das mudanças climáticas. São 136 mortos, 756 pessoas feridas,
enquanto 125 seguem desaparecidas. Além de 71.398 pessoas em abrigos, 339.928
desalojadas e um total de 1.951.402 pessoas afetadas. (Fonte: Agência Brasil)

Essas tragédias ambientais, infelizmente, têm sido cada vez mais recorrentes e
devastadoras, deixando em seu rastro destruição e dor. É crucial ressaltar que muitos
desses desastres poderiam ser evitados ou mitigados com ações políticas eficientes e
comprometidas com a preservação ambiental e a segurança das comunidades.

A inação política é uma das principais causas por trás desses eventos extremos, e suas
consequências são profundamente danosas. A ausência de regulamentação e fiscalização
adequadas das atividades humanas prejudiciais ao meio ambiente, a priorização de
interesses econômicos sobre a proteção ambiental e a falta de investimentos em
infraestrutura resiliente são fatores que contribuem diretamente para a ocorrência e
intensificação das tragédias.

O clima não possui fronteiras e os efeitos das mudanças climáticas são sentidos
globalmente, afetando principalmente as comunidades mais vulneráveis, mesmo que não
sejam elas as responsáveis pelo aumento da emissão dos gases do efeito estufa.

A responsabilidade política perante às mudanças climáticas

O poder público tem grande responsabilidade na implementação de políticas e medidas que
visam prevenir enchentes, reduzir as emissões de gases de efeito estufa, promover o uso
de energias renováveis, proteger áreas naturais e adotar práticas sustentáveis em diversos
setores econômicos. Diante da falta de engajamento político ou de resistência em adotar
tais medidas, as consequências são severas.

As consequências econômicas das mudanças climáticas, como danos a infraestruturas,
perdas agrícolas, aumento dos custos com saúde e reconstrução pós-desastres ambientais,
representam um ônus significativo para as sociedades e os sistemas econômicos.
Ocusto do reparo é maior do que o custo da prevenção.

É preciso agir agora, para adaptar as cidades a nova realidade climática, evitando assim
que outras localidades sejam atingidas com eventos extremos cada vez mais frequentes.

As consequências da inação política

A intensificação de eventos climáticos extremos, como furacões, secas prolongadas,
enchentes e ondas de calor, é uma das consequências diretas da falta de medidas para
reduzir as emissões de GEE e adaptar as sociedades às mudanças climáticas. Hoje, o Rio
Grande do Sul está nos contando a consequência extrema dessa triste história.
Atualmente, cerca de 8,9 milhões de indivíduos residem em áreas de maior
vulnerabilidade no Brasil.

Uma pesquisa conduzida pela Casa Civil e pelo Ministério das Cidades revela que 1.942
municípios, representando 34% do total, possuem áreas com população exposta a riscos
como deslizamentos, enxurradas e enchentes. Esse número representa um aumento de
136% em relação ao levantamento anterior realizado em 2012 pela Casa Civil. Só no
Estado do Rio Grande do Sul são 142 municípios os mais suscetíveis a desastres naturais,
inclusive a capital Porto Alegre. Isso representa cerca de 313 mil pessoas em áreas de
risco.

A situação é gravíssima e não há previsão para a volta da normalidade. A população do
Estado do Rio Grande do Sul vive nesse momento com o racionamento de água, o
desabastecimento dos mercados, o impedimento do deslocamento, além dos danos às
moradias e aos bens materiais e imateriais. Esses são efeitos da degradação ambiental de
todo o ecossistema da região.

Perspectivas para a ação política futura

Diante desses acontecimentos, é fundamental que a ação política seja pautada à luz da
sustentabilidade e da democracia, pela ação nacional e a cooperação internacional e
interfederativa.

Algumas medidas e perspectivas para uma ação política efetiva incluem:

● Uma Reforma Tributária estruturante

A reforma tributária pode corrigir distorções e gerar novos incentivos para atividades
econômicas de acordo com o seu impacto no meio ambiente e na saúde. O movimento pela
reforma tributária 3S defende a adoção do imposto seletivo como ferramenta para
sobretaxar atividades econômicas com base em princípios ambientais e climáticos. Também
defendemos a alocação de recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) e que
os regimes especiais e favorecidos de tributação estejam voltados para a conservação do
meio ambiente. É preciso garantir que a Reforma Tributária seja convergente com o Plano
de Transformação Ecológica e com a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).
Uma nova economia também exige a criação de uma taxonomia sustentável que sinalize
com farol verde quais atividades mais podem contribuir com uma sociedade próspera, para
que essas sim tenham benefícios fiscais.

No primeiro semestre de 2023, o governo elegeu a substituição ao Teto de Gastos pelo
Novo Arcabouço Fiscal (NAF) e a aprovação da Reforma Tributária como prioridades dentro
da agenda econômica. O NAF já foi regulamentado, e a Reforma Tributária foi aprovada no
Congresso, mas ainda tem uma série de temas que ficaram para ser definidos em Lei
Complementar. Além disso, está previsto um período de transição no qual a implementação
do novo IVA (Imposto sobre Valor Adicional) começa a vigorar apenas a partir de 2026 e a
vigência integral do novo sistema só ocorrerá em 2033.

● Políticas de adaptação e resiliência locais:

Entendemos como de extrema importância o engajamento dos governos locais na
implementação de políticas públicas e na gestão ambiental, uma vez que é nas cidades e
no território que são sentidos os principais efeitos das mudanças climáticas.
O que se nota, no entanto, é que apesar da importância da atuação dos municípios na
gestão ambiental, devido ao grande comprometimento das suas receitas, eles têm pouca
margem de atuação.

Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) a partir de dados do Siconfi
Secretaria do Tesouro Nacional, concluímos que sobra muito pouco dinheiro aos municípios
para a realização de investimentos (cerca de 7%).

Além da dependência de repasses da União e do Estado e da baixa arrecadação própria,
também é de extrema importância a constituição de uma estrutura administrativa e de
governança para tratar da gestão ambiental, com a criação de órgãos fiscalizadores dentro
dos municípios, medida que, inclusive, possibilitaria uma melhora da arrecadação e,
consequentemente, a ampliação dos investimentos.

O IDS em conjunto com parceiros da sociedade civil está construindo a Bússola para
construção de cidades resilientes, que propõe aos cidadãos e candidatos à gestão
municipal priorizar nas suas plataformas e programas de governo ações diversas para
ampliar a capacidade de adaptação por meio do protagonismo dos municípios.

● Investimentos em infraestrutura sustentável, proteção de áreas naturais e planejamento urbano resiliente

Plano de Transformação Ecológica lançado em agosto de 2023 juntamente com o PAC
(Plano de Aceleração do Crescimento) prevê um novo arcabouço regulatório e como eixo
estratégico o investimento em infraestrutura verde

É importante ressaltar que se tratam de investimentos que requerem um alto montante de
recursos públicos e privados para serem viabilizados, assim como envolvem altos riscos.
Desse modo, os financiamentos públicos ao serem mobilizados e orientados a áreas
particulares, devem criar objetivos e caminhos a serem perseguidos em direção a uma
economia mais sustentável.

O IDS em parceria com o Insper está organizando uma série de diálogos com setores
estratégicos da economia para reunir experiências exitosas e melhores práticas e
inovações, para uma Transição Econômica Verde Sustentável. Os próximos eventos serão
divulgados em nossos canais.

● Engajamento político e social
A promoção do engajamento ativo da sociedade civil, da juventude, das empresas e das
organizações não governamentais na promoção de soluções sustentáveis, pressionando
por decisões públicas e privadas mais eficazes e responsáveis são de extrema importância.

Também, a aprovação de projetos de lei voltados para causas ambientais e sociais é
fundamental para promover avanços significativos na proteção do meio ambiente, na
promoção da justiça social e na garantia de direitos fundamentais para a população.

O IDS em parceria com várias organizações da sociedade civil está movimentando a Virada
Parlamentar Sustentável para ampliar a interlocução da sociedade civil organizada com o
Parlamento sobre temas relevantes da causa socioambiental. Foram 37 eventos que
proporcionaram aprofundar o debate sobre assuntos considerados positivos para o
desenvolvimento sustentável do País. É uma oportunidade para participar e contribuir para
a sustentabilidade e democracia. Os eventos estão sendo divulgados em nossas redes.

Um cenário de grandes desafios e um olhar para as soluções

As mudanças climáticas resultam em consequências de curto, médio e longo prazo
que afetam não apenas o meio ambiente, mas também a saúde humana, a economia e a
estabilidade global.

Neste contexto, discutir e aprofundar sobre a importância desses projetos é
essencial para conscientizar a sociedade e os legisladores, além de garantir mecanismos
de fiscalização e monitoramento para a efetivação dessas leis e o cumprimento de seus
objetivos, tanto no nível federal como estadual e municipal.

Os casos emblemáticos de “Brumadinho”, “Mariana”, “São Sebastião” e outros
demonstram a dificuldade de implementação dos serviços de monitoramento e fiscalização
dos Planos de Gestão Urbana e Gestão Orçamentária dos governos locais vinculados ao
controle das finanças públicas e orçamento, destinados pelos governos estaduais e
Governo Federal.

Na tragédia do Rio Grande do Sul é público os informes de investimentos de Porto
Alegre de melhoria de proteção contra cheias e inundações, no importe de R$ 327.143,48,
no ano de 2020; R$ 1.788.653,32, no ano de 2021; R$ 141.921,72, no ano de 2022, e sem
item lançado nos relatórios oficiais, no ano 2023. Com a apresentação de investimentos, em
valores insuficientes, em centavos de investimentos de controle das cheias e inundações, e
outros planos de gestão urbanísticas dos municípios do estado. Em contrapartida,
diuturnamente divulgado sobre a necessidade de investimentos de infraestrutura nos meios
de comunicação.

A região territorial foi repetidamente afetada por cheias e inundações, ou seja, fato
conhecido e previsível das autoridades e população, nos últimos 3 anos, porém, sem um
plano de gestão integrado de entes, setores e órgãos, e entre governos municipais,
estaduais e federal, para atender a demanda previsível das inundações, em Porto Alegre e
toda a região sul do Brasil, resultando nesta calamidade ambiental.

Os dados orçamentários revelam a falta de investimentos em infraestrutura e
planejamento urbano das cidades e municípios, o atendimento aos planos de gestão e
governança integrada e compartilhada, no Rio Grande do Sul e no Brasil.

É urgente e imperativo que os líderes políticos e as instituições governamentais assumam a
responsabilidade de implementar políticas públicas e medidas efetivas e coordenadas para
mitigar os impactos das mudanças climáticas e promover uma transição para uma gestão
pública integrada do Plano de Mudanças e Alterações Climáticas no Brasil. Somente com
uma ação política decisiva e comprometida será possível enfrentar esse desafio global e
garantir um futuro viável e sustentável, para as gerações presentes e futuras

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