COP 28: Expectativas com sorrisos e frustrações

22/12/2023

Depoimento de Marcos Woortmann, para o IDS Brasil –

A COP é, de fato, um evento único e interessantíssimo, um local de muito aprendizagem e inspiração, porque vemos aquilo que é feito por pessoas do planeta inteiro e nas mais diversas frentes ambientais. São trabalhos de preservação de biomas inteiros, da biodiversidade, da água, dos povos tradicionais, transformação da economia, da infraestrutura e da tecnologia. É um universo inspirador em termos de parcerias, de mobilização, de conhecimentos e recursos em prol de soluções. É, sobretudo, algo que demonstra de forma muito patente que existem soluções, e elas não estão distantes, elas apenas precisam ser amplificadas.

As 130 mil pessoas envolvidas na COP 28 formam um microcosmo pera representar os 8 bilhões de habitantes da Terra. É um extrato muito reduzido da sociedade civil organizada e de setores dos diversos governos que estão tentando chamar atenção já há quase 30 anos para um problema que é de todos, a emergência climática. E nem só isso, acidificação dos oceanos a perda da biodiversidade a poluição, enfim, toda uma série de outros grandes desafios que se conectam profundamente. A COP é positiva em termos de ampliar a perspectivas e capacidades de conexão. No entanto, também demonstra muito claramente o limite de uma amostragem tão pequena de energia, de recursos e de pessoas.

Conexão com as agendas do IDS

As agendas do IDS são uma métrica de ação para a democracia e a sustentabilidade, são temas muito caros à sociedade civil organizada. Nesse sentido o cenário na COP 28 possibilitou muito encontros e uma série de afinidades em projetos e iniciativas com uma ressonância muito clara com o trabalho que realizamos no IDS. Apenas para citar alguns exemplos, a questão da governança global, mas focada no local, na adaptação e na mitigação em nível da gestão de cidades e comunidades. O olhar para a gestão Municipal, e sobretudo, também, em nível comunitário, muitos exemplos, muitos casos, muita troca de conhecimento e aprendizado.

Conhecer essas muitas experiências é absolutamente inspirador, é perceber que em muitas partes do mundo há organizações que estão atuando de forma parecida com o que o IDS faz no Brasil.  Plataformas de análise de dados, projetos semelhantes ao JusAmazõnia, trabalhos que dialogam com o Pacto Federativo, cursos oferecidos à população. Projetos oferecidos globalmente pela ONU que têm uma identidade com a proposta de sermos um Think Tank de sustentabilidade e democracia.

É gratificante enxergar a profunda sinergia que existe, de entendimento, absolutamente transversal de todos esses atores na busca da sustentabilidade. Entre quase todos há o entendimento explícito de que democracia e sustentabilidade são irmãos siameses em busca de valores e de respeito à diversidade, respeito a ciência e o desejo de um novo paradigma de humanidade.

Uma COP no reino do petróleo

A questão do petróleo é o grande mastodonte na sala de estar nesta COP. Esse é o maior desafio que temos como humanidade, conter as alterações climáticas em até 1,5 Cº grau em média. Porém, não fomos capazes de reduzir as emissões no ano passado, que cresceram mundialmente 8%. Quando é que vamos parar?

O petróleo não é apenas o maior desafio climático e econômico do mundo. A COP 28 foi realizada num país petroleiro, mas o Brasil também deu sinalizações decepcionantes e preocupantes durante a COP. A primeira foi a inserção do país na OPEP+, o grupo de países produtores de petróleo, e o anúncio do leilão de áreas novas para a exploração de petróleo foi outro choque. Muitas dessas áreas extremamente problemáticas em termos ambientais. com potencial de afetar manguezais recifes de corais, Fernando de Noronha, Abrolhos, e outras unidades de conservação e territórios tradicionais.

Esse leilão emitiu uma sinalização profundamente contraditória do país, que em nada contribuiu para o discurso ambientalista que vem encantando a sociedade global.  Foi um golpe no desejo de liderar transição uma climática, e justa. Isso não vai acontecer se o Brasil for investir nessa forma de industrialização e geração de divisas. Deixar o petróleo é precisamente o maior desafio da humanidade.

Dubai, uma cidade fora do mundo

Dubai é uma cidade cosmopolita. Tudo é muito novo, nada tem mais do que três décadas. Menos de 30% da população de pouco mais de 3,5milhõe é de nativos dos Emirados Árabes Unidos, a maior parte é formada por imigrantes de muitas partes do mundo, especialmente de países asiáticos, da Índia e de países africanos. Todos convivendo em uma completa liberdade religiosa. O que impressiona é que as pessoas comuns, trabalhadores e moradores da cidade que sediou a Conferência do Clima, não têm a menor ideia do que sejam as mudanças climáticas.

Não há liberdades democráticas em Dubai e, mesmo estando em um dos locais mais suscetíveis às mudanças do clima, o assunto não é colocado para a população, que vive sob um regime ditatorial e controlador. Um exemplo do controle é que ligações pelo WhatsApp apenas podiam ser realizadas no ambiente da COP. No restante da cidade o aplicativo não funciona. Manifestações políticas não são permitidas e os canais de comunicação são censurados e controlados.

Um olhar para dentro

Estar na COP 28 foi uma experiência muito estimulante. Conhecer boas experiências em projetos e em modelos de cooperação. Poder conversar com pessoas do mundo todo que trabalham com temas e projetos que apontam para o mesmo futuro que nós, organizações sociais, desejamos para o Brasil. Estar junto de seres humanos de mutas línguas, muitas culturas, muitas religiões e etnias é uma troca que só é possível ao vivo. Mesmo que a tecnologia ajude a manter vivas as relações, elas são mais fortes quando germinam com o calor de um aperto de mão.

Muito importante a percepção de que as agendas do IDS estão alinhadas aos anseios que existem em toda a gente. Que estamos em um caminho compartilhado com pessoas de todo o mundo. Que a união dos esforços em cada local será capaz de fazer uma transformação global.

Marcos Woortmann – Coordenador de políticas socioambientais do IDS.
Cientista político e mestre em Direitos Humanos pela Universidade de Brasília, com foco em diálogo intercultural e participação social. É ambientalista, consultor em governo e políticas públicas. Trabalha no terceiro setor com advocacy desde 2006. Foi supervisor de projetos do terceiro setor no Governo Federal, assessor legislativo na Câmara Legislativa do Distrito Federal e Administrador Regional pelo Governo do Distrito Federal. Atualmente integra o conselho de OnGs socioambientalistas e de direitos humanos. É associado do IDS desde 2023.

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